Iza Calbo
Começa a anoitecer e não há nada por trás das nuvens
No casulo intempestivo dos desejos
Somos castos e sonoros como ventos intransponíveis
E, enquanto o entardecer entorpece,
A alma procura resoluta o teu avesso
Não te chamo pelo nome, porque te teço de encanto
Os pássaros tontos são, todos eles, mudos
Então calo-me também para que não os afugente
Com a beleza pela qual te proclamas
Sei que estás perto, sei que estou longe
Há mistério em todos os véus que dispo
Em todos os cantos que meus pés desviam
E é bom estar longe do solo que também pisas
Vez ou outra desenhando trilhas
Não, não quero a sensatez do amor perfeito
Quero a dor do querer estilhaçado
E é sempre assim quando distante me deito
Na cama que arrumei para te colocar ao lado
Também dispenso o teu beijo de outra boca
E finjo não ver que te transformas em incógnita
Todas as vezes em que meus lábios sentem o beijo recente e desconhecido
Acostumo-me a te ter assim aos poucos
A te consumir lentamente
Quase como se fosses desaparecer de repente
Como às vezes o faz solenemente
Talvez beba assim o pecado mais sutil
E me deixe levar pelo veneno mais mortal de todos:
O de te amar sem nada esperar e seguir esperando que me ames
Minha face rubra de estupidez
Entrega aos passantes a condição de amante
E tonta e sem saber por onde ir
Cato nas fontes perdidas das cidades
Uma água que me mate, mas não de sede
Aprendi a ficar só e à espera
Só e inutilmente
Cavoucando nos papéis que escrevo e amasso
Um amor que nem sei se sentes
Rasgo trechos inteiros de intenções
Por que na poesia deste descompasso
Não encontro a verve do amar que traço
2 comentários:
Gostei mesmo da mexida nas águas que você fez no teu blog, Iza... junto com isso, emerge a poesia mais profunda... gosto do que você escreve, do jeito que você conduz as palavras... beijo procê
Perfeito!
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