domingo, 19 de agosto de 2007

HOMENAGEM PÓSTUMA


Eu sou o que você ou ela ou ele não podem ser.
Sou a metralhadora que dispara e não mata
Ou que mata, quando precisa.
Em alguns dias sou o amor que você gostaria de ter.
Noutros, o que teve nem notou e,
ao longo dos meses, poderia ter tido de fato.
Sou como a serpente que só ataca quando sente
Ou que, à noite, distraída, deixa-se esmagar na estrada pelo carro que passa.
Alguns dias sou multiétnica e,
noutros, caucasiana.
Até pego emprestado os olhos verdes e quase cegos do meu pai.
Mas, sei, sou muita gente.
Não preciso de tapete vermelho para que cheguem até mim.
Luvas de pelica me bastam.
Arranque meu coração, mas não esqueça:
antes arrancarei a tua alma, se ainda a tiveres.
Tente viver longe de mim e, quando sentir falta,
escuta Cazuza e o assombro dos versos de quem ouve e confessa, ao ouvido,
teu e dos outros, "segredos de liquidificador".
Não me diga que sou pequena, pois a grandeza que possuo te dei de graça.
Cala! Não fala mais nada. Experimenta amargar o sal da terra,
A morte que está e não chega.
Não me escute. Ouve o passado que corrói os teus ossos.
Eu?
Eu sou feita de aço.
Inoxidável, caminho pelos campos que, antes verdes,
tornaram-se desertos intermináveis.
Cata tuas coisas e segue.
Vê o que te espera.
Mas vê de antevéspera,
porque depois não há como voltar.
E se quiser dizer Eu Te Amo para mim,
para ela ou para ele,
Grite isto para um pássaro que, em seu vôo sem destino,
Consiga, talvez, espalhar tal confissão como quem dita o próprio epitáfio.

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