segunda-feira, 30 de novembro de 2009



POEMINHA DA SAUDADE

IZA CALBO


Toquei teu corpo.
Tudo parecia tão perfeito: o cheiro, a pele, o desejo.
Enrolei teus cabelos finos entre meus dedos
E cheguei mais perto.
Quando abriste os olhos
Vi vontades idênticas
E um abraço enroscado pareceu matar a sede
Dos ideais de amor perseguidos.
Olhei teu riso demoradamente
E lembrei do quanto gostávamos dessa cumplicidade.
De lamber o nosso suor
De tentar entender as nossas alegrias
E sanar as possíveis tristezas.
Quando amanheceu,
Cruzei a rua ainda em êxtase
E chorei um choro tão intenso e calado
Que até os pães que trazia comigo
Se encolheram no pacote
Para não incomodar.
De volta,
Abri a porta do apartamento
Dei comida aos peixes
E fui até o quarto
Em busca daquele calor
Sem necessidade de serenidade.
Não havia nada.
Não havia ninguém.
Mesmo as palavras tecidas à noite
Faziam parte do sonho entorpecido de ter novamente
O que jamais voltará a ser.
Liguei o computador
Peguei os e-mails
E chorei.
Só podia fazer isso.
Nada mais nem menos.
Olhei o sol pela janela
E voltei à rua em busca dos temperos esquecidos.
Guardarei até a morte
Ou além dela
Esta sensação de perda em vida
Que deixaste cravada no âmago do meu sentir.
Nem o teu sumiço evitará a mágoa
Ou apaziguará esta sensação dolorosa
De amar, amar...
E acordar sem te ter por perto.
Creio que a isso se possa chamar SAUDADE.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

BAÚ ONLINE



Estava catando velhas fotos no baú da modernidade.

Encontrei velhos nomes

Vi a que eu era, com vestes bem diferentes e cabelos lisos

Vi que quem eu era já não era eu

E tudo pareceu tão transitório

Tão sem sentido

Tão abstrato

Como numa tela pintada no meio da rua

Não havia gênios nem nada

Apenas a espada lançada sob minha cabeça

De memórias embotadas

Vi as mesmas roupas nele,

As mesmas pessoas,

As mesmas festas...

Vi que não fui absolutamente nada

Nem mesmo figurinha num álbum que se coleciona

Esta sensação de vida trocada,

De vida passada,

De vida perdida,

Encheu a minha tarde de uma tristeza tão cinza

Que nem as cinzas que serviam ao desenho dele –

Sobre os quais opinava –

Poderiam ser comparadas às labaredas da história desfeita.

Não sei como ela alisou os cabelos

Não sei como ela o levou tão rapidamente

Só sei que o fez

E que ele, sem um sequer “solene”, o consentiu.

Fiquei com o amargor das mentiras de ambos

E de todos que circulavam à nossa volta

Quando eu era ela

E ela era parte de um passado morto.

Senti raiva por “ressentir”

Por me encher de veneno

E vê-los vivos e vibrantes naquelas fotos

Que, antes, teriam me captado tão intensamente

Num amor apenas por mim sentido

E experimentado

Quis vender os cabelos dela

Quis tomar as roupas dele

Vazar os olhos dos “nossos” amigos

Buscar o chão onde só escombros restaram

De algo tão indefinível como os sete anos perdidos

Por alguém que não valeria sete miléssimos de segundos.

Engoli a mágoa.

Calei o choro

E escrevi.

Não exorcizei os sonhos nem mesmo as dores,

Mas sei que estou aqui

E que nunca, em momento algum, fingi amar

Para ter um lugar aonde pudesse dormir.

Descansaste -, pergunto?

Creio que sim.

E na nova cama, passarás o resto de vida que te resta

Ou resgatará mais um “alguém” do passado

Para matar o presente que teces com a tua insensatez?
Não terei resposta. Nem quero.

Apenas me lamento por ter amado como amei.

Amado como quem não deve a quem não deveria

E sigo, assim, meio partida, mas ainda de pé

Em busca de oceanos menos lodentos

De pessoas mais verdadeiras

E de sonhos com possibilidades de verdades.

Talvez queira demais.

Mas só quero isso.